Quando uma cidade brasileira voltou à
Idade Média
Popularmente, o
termo macumba é utilizado para designar pejorativamente vários
cultos sincréticos praticados comumente no Novo Mundo, sob a
influência de religiões como o Candomblé e mesmo os cultos indígenas de algumas
tribos.
Porém, ainda
que macumba habitualmente seja confundida com tais práticas
religiosas, os praticantes e seguidores dessas religiões rejeitam o uso do termo
para designá-las. A macumba, na acepção mais popular do termo, se refere
mais propriamente ao feitiço, ou despacho.
Tanto a Umbanda
quanto o Candomblé normalmente trilham suas práticas no caminho do bem, mas
existem terreiros que se dedicam também (ou tão somente) à prática da magia
negra, fazendo trabalhos que não raro exigem sacrifícios de animais. O
sacrifício humano pode ocorrer algumas vezes, como ocorreu no caso ora
relatado.
Cantagalo, cidade
pacata do Estado do Rio de Janeiro, contava à época com uma população em torno
de 15.000 (quinze mil) habitantes. Na época dos fatos, por conta das suas
extensas reservas de calcário então descobertas, a região vinha atraindo o
interesse de vários grupos internacionais.
No dia 07 (sete) de
outubro daquele ano, durante um piquenique, foi sequestrado Antônio Carlos
Viana, conhecido como Juninho, uma criança de apenas 2 (dois) anos de idade.
Inúmeras buscas foram feitas pela região, mas sem sucesso algum, até que, no
dia 14 (quatorze) de outubro foi encontrado o cadáver da criança, sem cabeça e
desmembrado.
Durante as
investigações em torno do caso a polícia descobriu que rituais eram realizados
na Fazenda Bom Vale, de propriedade de Moacir Valente, durante os quais eram sacrificadas
crianças, “de preferência louras e do sexo masculino”. O objetivo destes
sacrifícios era obter, junto a entidades do mal, vantagens para Moacir Valente
em suas negociações com grupos australianos e alemães que pretendiam se
associar a ele na exploração das reservas de calcário existentes em suas
terras.
Sob a orientação de Pai Ogir ou Ogideir (Ajuricaba Coutinho de Souza), suposto seguidor do que
denominava umbanda de Angola, o resultado das negociações com as
multinacionais poderia ser favorável a Moacir, desde que este atendesse ao
pedido do santo Tranca Rua das Almas, sacrificando uma criança.
A criança foi
sequestrada quando estava sob os cuidados de sua tia-avó Maria da Conceição
Pereira Pontes, tia de Sandra (mãe da vítima Antônio Carlos) e empregada na
fazenda de Moacir. Após o sequestro, Moacir mandou prender a criança num paiol
da fazenda, onde a mesma ficou até o dia do sacrifício, quando foi morta por
Valdir e Fiote, empregados na fazenda de Moacir Valente..
Segundo o depoimento
de Valdir Souza Lima: “No dia 10 eu e o Fiote pegamos o garoto e o levamos para
uma figueira que fica na entrada da Fazenda Bom Vale. Lá tem o cercado de arame
e, no meio, um altar cheio de imagens. Eu peguei o garoto pelos braços, e o
Fiote, com um canivete, cortou o pescoço dele, deixando o sangue derramar numa
tigela. A criança deu um gritinho e morreu. Quando já tínhamos tirado todo o
sangue, resolvemos esquarteja-lo, cortando os braços e a cabeça. Embrulhamos o
corpo num saco de papel e levamos a tigela com o sangue para seu Moacir
Valente. Ele bebeu uma parte e mandou que a gente jogasse o resto na cachoeira
da fazenda”.
Com a criança
desaparecida, todos os esforços para localizá-la haviam se revelado inúteis,
levando a polícia a suspeitar que houvesse se afogado em alguma das cachoeiras
da região, ou que tivesse sido levada por ciganos, mas não se descobriu nenhuma
pista. Até que no dia 14, um tio da criança encontrou os braços cortados e a
cabeça jogada num outro canto, próximo a um estábulo da fazenda, e, mais
adiante, o corpo com as pernas.
No dia 17, quando Fiote foi preso, já corriam pela cidade as notícias sobre os rituais de magia
negra na fazenda. Foi neste dia 17 que Valente decidiu retornar do Rio de
Janeiro para Cantagalo, sob a proteção do Coronel Góis, para se apresentar à
polícia.
Quase ao mesmo tempo,
em Cantagalo, amigos do carreteiro Antonio Carlos Vieira, pai do menino morto,
instigavam a população a fazer justiça com as próprias mãos.
Às 19 (dezenove)
horas a multidão que começara a se juntar por volta de 15 (quinze) horas já
somava quase 2.000 (duas mil) pessoas. Armados de paus, foices, marretas e
pedras, rumaram para a Delegacia de Polícia. Apenas 3 (três) policiais civis e
7 (sete) militares lá estavam. Ali também se encontravam presos, em celas
separadas, Moacir Valente e Anésio Ferreira (o Fiote).
A multidão forçou a
retirada dos policiais e invadiu furiosamente a delegacia, arrebentando tudo o
que via pela frente. “Fiote” e Valente foram localizados e brutalmente espancados.
Enquanto uns traziam ambos para a rua, outros tratavam de incendiar as viaturas
que estavam estacionadas na porta da delegacia.
Segundo Renato
Godinho, então delegado de Cantagalo, Fiote e Valente ainda estavam vivos
quando foram atirados às chamas.
(Nota: Fotos do jornal O GLOBO, digitalizadas da revista EROS nº 2 - 2ª quinzena de novembro de 1.979).
(Nota: Fotos do jornal O GLOBO, digitalizadas da revista EROS nº 2 - 2ª quinzena de novembro de 1.979).
Moacir Valente Anésio Ferreira (Fiote)
Wilson e Maria da Conceição (implicados nas mortes)
Os pais de Antônio Carlos
"Macumba" com galo morto encontrada na Fazenda Bom Vale
Viaturas em cujas chamas foram queimados Valente e Fiote
Jornal da época, tratando do caso.